#CADÊ MEU CHINELO?

terça-feira, 30 de outubro de 2007

COMÉRCIO JUSTO

Licenças Livres e a Multiplicação do Conhecimento (mix version)

txt: Tiago Jucá Oliveira
clb: Pedro Jatobá e Isaias Morto


O que seria desta revista não fosse o plágio? O nome - dilúvio - foi tirado da bíblia, e o slogan - não chove no molhado - copiamos de uma expressão popular. E como seria possível realizar esta reportagem sem se apropriar de idéias alheias como se fossem nossas? De que forma poderíamos nos expressar sem que houvesse, ao longo da evolução humana, o aprimoramento do conhecimento que a partir de agora passamos a abordar e defender? De acordo com o grupo Critical Art Ensemble, "o plágio tem sido há muito considerado um mal no mundo cultural, visto como um roubo de linguagem, idéias e imagens executado pelos menos talentosos. Talvez as ações dos plagiadores sejam as que mais contribuem para o enriquecimento cultural. Antes do Iluminismo, o plágio tinha sua utilidade na disseminação das idéias. Um poeta inglês podia se apropriar de um soneto de Petrarca, traduzi-lo e dizer que era seu".

Quem enriquece o pensamento acima é o escritor italiano Wu Ming 1: "se houvesse existido a propriedade intelectual, a humanidade não haveria conhecido a Ilíada e a Odisséia, a Bíblia e o Corão, todos eles felizes produtos de um amplo processo de mistura e combinação, re-escritura e transformação, isto é, de 'plágio', unido a uma livre difusão e a exibições diretas". O direito intelectual é conseqüência do novo modo de produção literária pós-Gutenberg. A primeira lei a respeito do assunto, surgida na Inglaterra em 1710, vem como o objetivo de proteger os autores. A legislação inglesa daquele ano dava ao criador o direito exclusivo sobre um livro por 14 anos e, se o autor ainda estivesse vivo quano o direito expirasse, poderia renovar o direito por mais 14 anos.

Após o ano de 1710, sucessivas mudanças acontecem. Os americanos, em 1790, copiam a lei inglesa, e estabelecem os mesmos 14 anos de direito autoral renováveis por mais 14. Conforme algumas obras venciam seus prazos e caíam em domínio público, as editoras passaram a pressionar o congresso dos EUA para aumentar esses prazos, até atingir, em 1998, através do Ato Sonny Bono de Extensão, os excessivos 95 anos de direito exclusivo sobre uma obra, mesmo sem que o autor a registre. O caso foi apelidado como Mickey Mouse Protection Act, pois a Disney estava preocupada que o famigerado rato caísse em domínio público em 2003. Mas, assim como o Mickey, outros tantos personagens de Disney são recriações de lendas e obras de domínio público: Robin Hood, Peter Pan, Pinóquio, etc.

"Deve o cidadão, sequer por um momento, renunciar à sua consciência em favor do legislador? Então por que todo homem tem uma consciência?", pergunta Henry Thoreau. Ele mesmo responde: "penso que devemos ser homens, em primeiro lugar, e depois súditos. A lei jamais tornou os homens mais justos, e, por meio de seu respeito por ela, mesmo os mais bem-intencionados transformam-se diariamente em agentes da injustiça". Hoje em dia é difícil encontrar quem nunca transgrediu alguma lei de direitos autorais. Todos responsáveis pela difusão e recombinação do conhecimento de uma maneira jamais vista. Se antes dos direitos autorais tínhamos uma cultura oral e livre, reproduzida no boca a boca, agora temos diversas opções de interação entre autor, obra e público. A tecnologia oferece variadas formas de produzir, copiar, colar, transmitir, reproduzir e transformar obras culturais. Mas uma barreira ligeslativa impede isso, ou tenta impedir. Wu Ming 1 alerta que "a cada dia milhês de pessoas violam o copyright". A desobediência civil, para Pablo Ortellado, "é uma violação pública das leis motivada por seu caráter ilegítimo e não reconhece que a lei que está sendo infringida seja justa".

Nem todos desobedecem por opção ideológica. Muitos marginalizam-se por motivos econômicos. Utilizam-se de tecnologias para reproduzir obras com qualidade inferior à original e revende-las por um preço mais barato. O paulistano Luciano complementa o orçamento da casa através da venda de CDs piratas. Fatura mais de 300 reais mensais pra ajudar no sustento do lar. As ruas centrais das grandes cidades brasileiras estão tomadas por camelôs, que vendem todo tipo de produto pirata. Por elas circulam pessoas como o paranaense Luís, porém sem os 30 reais necessários pra comprar os CDs originais de seus ídolos.

Nossa cultura recombinante teve uma boa pincelada com o movimento hip hop. No começo dos anos 80, o Sugar Hill Gang pega a base de "Good Times", sucesso do Chic, e transforma em "Rapper's Delight. Foi um dos primeiros e importantes passos do rap, mas não impediu que o Chic tentasse instalar um processo por plágio. A briga travada pela indústria cultural em nome dos direitos autorais talvez não existisse caso ela própria não tivesse inventado suas tecnologias. "As mesmas corporações que vendem samplers, fotocopiadoras, scanners e masterizadores se descobrem prejudicadas pelo uso de tais instrumentos".

Assim, hoje vemos uma imensidão de obras culturais presas pelo copyright. Filmes já sem mercado comercial decompondo-se com o tempo e que não podem ser digitalizados, livros raros apodrecendo que não são copiados ou traduzidos e discos fora de catálogo sem permissão de chegar aos ouvidos.

Com o avanço tecnológico e com as contradições das obsoletas leis autorais, muitos artistas optaram por disponibilizar suas obras com licença livre. O caso da banda recifense Mombojó é o mais curioso. Ela lançou seu primeiro CD - Nadadenovo - pra ser vendido, e ao mesmo tempo o deixou liberado para download no seu site. O CD vendeu em torno de 20 mil exemplares em todo Brasil. Shows nas maiores cidades do país, participações em festivais e eventos importantes e contrato com a gravadora Trama. De acordo com o guitarrista Marcelo Machado, colocar as músicas na internet "ajudou a aumentar as pessoas que vão aos shows e cantam as músicas. E quem gosta, compra o CD. Outro integrante do Mombojó, Marcelo Campello, também liberou seu disco de carreira solo, pois tem certeza de que o disco cairia na internet "independente da minha vontade, então prefiro canalizar essa energia pra minha página - dessa forma tenho acesso às estatísticas e estabeleço um contato mais direto com as pessoas".

Convidado para fazer a trilha sonora do filme Narradores de Javé, o sergipano DJ Dolores preferiu apenas compor e deixou para outros músicos a missão de remixar a trilha inteira. "Quando você permite que as pessoas mexam na sua música, isso dá possibilidade dela ser várias vezes multiplicada. Quem sabe alguém não faça algo melhor e aquilo estoure?", pergunta Dolores, que já fez turnês pela Europa, onde chegara livremente em formato mp3.

O jornalismo tem muito a progredir com as licenças livres. Faz surgir um elemento antes inviável aos pequenos meios de comunicação: cobertura à distância de fatos e eventos sem a necessecidade do correspondente. Cada meio torna-se uma potente sucursal de outros, e vice-versa. O seu blog pessoal pode cobrir o festival RecBeat, realizado todo ano no Recife, com vídeos do site Recife Rock e incrementa com podcast do site CircuitoPE.

Em todo país brotam experiências colaborativas. São múltiplas as possibilidades de ação. O fortalecimento do conhecimento compartilhado e economias solidárias são objetivos fundamentais, que vamos perseguir em busca do comércio justo entre as pessoas.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

AQUI FARROUPILHA

Kassin+2, Pata de Elefante e Monarco

txt: Marexal
phts: Marexal
vds: Marexal e Chong de Nardi


Quinta-feira, noite de 20 de setembro de 2007.

Enquanto o feriado farroupilha vai se acabando eu caminho pelas ruas chuvosas do Menino Deus até a casa de um amigo, de onde sairemos pra uma noitada de shows pela cidade. Apesar do 20 de setembro, data principal dos gaúchos, o roteiro não inclui nenhum show gaudério ou tradicionalista, o que estamos prestes a ver são os shows das bandas Kassin + 2 e Pata de Elefante no palco do opinião. Duas bandas ainda desconhecidas do grande público, mas já respeitadas no uderground e entre apreciadores de rock e MPB.

A Pata de Elefante é uma banda de rock instrumental que movimenta a cena local há mais de 2 anos e que, aos poucos, vem se consolidando no cenário nacional como uma das referências da música de Porto Alegre, na sua veia roqueira. Mas a Pata é uma banda que eu já tive oportunidade de ver em várias ocasiões, o que me fez sair de casa na noite chuvosa do 20 de setembro foi a banda Kassin + 2, que também atende pelos nomes: Moreno + 2 e Domênico + 2. Já havia sido propagandeado o quanto os caras que formam este trio entendem de música e estão por dentro de ótimos projetos da MPB. O disco que conheço e que fiquei muito grato de ouvir chama-se Futurismo, o último do trio. Segundo meu amigo, um cara que tá sempre ligado nas novidades da MPB, a banda no momento atende por Kassin + 2 pelo fato deste último disco ter sido produzido pelo guitarrista e baixista da banda, kassin, que já produziu nomes de peso da música japonesa, ou melhor, brasileira como: Los Hermanos, Vanessa da Mata e Caetano Veloso, por exemplo.

Como havia dito antes, meu amigo é um cara que tá sempre antenado nas novidades da MPB, mas não me expressei direito, na verdade ele é um consumidor compulsivo, não só de novidades, mas da música brasileira como um todo. Por isso mesmo, não lhe passou despercebido que um grande nome do samba estava se apresentando na cidade naquela mesma noite. Chegando a casa dele, fui informado de que, antes de rumarmos pro Opinião, daríamos uma passada no clube Saldanha da Gama, que fica ali ao lado do Beira Rio, para assistirmos ao show de Monarco, da velha guarda da Portela. Eu como todo bom sujeito, topei na hora e pra lá fomos, eu ele e sua namorada.

Chegando ao clube Saldanha da Gama, que mais parece uma quadra de escola de samba, já estava no palco vestido de azul e branco o grande Monarco. Confesso que se passasse pelo cara na rua não saberia de quem se tratava, só conhecia de nome. Acompanhado de uma banda local, caras que eu já havia visto tocando samba na noite porto-alegrense, Monarco manda um repertório certeiro pra quem conhece um pouco de samba cantar junto refrões como: “Portela eu nunca vi coisa mais bela”... Ou “foi um rio que passou em minha vida e meu coração se deixou levar”, grande Paulinho da Viola, ou como chamou Monarco: Paulo da Portela! O show foi excelente pelo repertório, pela voz deste verdadeiro mestre do samba e menos pela banda que não estava a mesma altura, excelentes músicos, mas parecia que faltava um surdo, faltava um cavaquinho, sei lá, o som não ajudava muito também. Mas os caras não comprometeram ao ponto de prejudicar o show, valeu a pena!



Dez minutos após deixarmos as cercanias do Beira-Rio estávamos na frente do Opinião para tomar uns tragos antes de entrar no recinto e ter que amargar a cerveja a seis reais e cinqüenta lá dentro. Logo na chegada uma constatação: público fraquíssimo. Realmente, nem parecia que era dia de show. Tá certo, fui pra lá empolgado por versos do tipo: “Quando você saia, a casa entristecia, as torneiras choravam, as portas esperando, você voltar ”, mas na verdade quem mais conhece esses versos, ou quem mais acha esses versos tão bons assim? Na grande mídia eles não estão, o que pra gurizada que já bebia nos bares ali da frente faz pouca diferença. Passaram-se mais alguns minutos e começávamos a ver figuras conhecidas da cena musical porto-alegrense. Público pequeno sim, mas empolgado.

Lá dentro, começa a Pata de Elefante e pra lá vamos. “Power” trio, mas na verdade são dois “power” trios! Gosto mais quando o Guedes pega a guitarra. A outra formação é a que começa os shows, alguns que vi pelo menos começaram com o prego, também conhecido por Gustavo Telles, na bateria, e o Daniel Mossman na guitarra, depois ele troca com o Gabriel Guedes, ficando com o baixo. Gosto do estilo do Guedes rifs harmônicos e suingue na mão direita.. Gostei da performance deles pra um Opinião ainda quase vazio. Eles não querem nem saber, dá pra perceber o prazer que sentem em tocar, a gana com que tocam seus instrumentos, um rock cult inspirado em The Band e Bob Dylan, segundo relatou o prego em outra ocasião.

A Pata se despediu e sem muita cerimônia os rapazes do Kassin + 2, que eram eles três, mais dois: um que reveza baixo e guitarra com o Kassin, Alberto Continentino , e outro que toca percussão e bateria, Stephane San Juan. Domenico toca bateria, canta e comanda uma mesinha de efeitos e bases pré-gravadas. Moreno, toca violão, canta e toca guitarra e o Kassin canta, toca guitarra e baixo. Pelo que sei os três compõem, é que nesta fase de internet e maquininhas digitais não compro mais cd e acabo não tendo acesso aos encartes e sem saber que música é de quem. Ta certo, como jornalista deveria ter buscado isso na internet e trazer a informação precisa aqui, mas não é a proposta deste texto. Mas enfim, as composições deles são o que mais me agrada, a musicalidade da banda é diferenciada do universo de bandas que estão aí aos milhões hoje em dia.



Que os caras têm um sentido aguçado para compor e arranjar eu já havia percebido ao escutar Futurismo e fiquei muito satisfeito ao vê-los tocar ao–vivo. Uma banda coesa e certeira que oferece várias nuances de melodias e estilos: de ritmos caribenhos a rifs de “guitar bands estilo anos 90”, passando pela Bossa Nova, pelo samba e pelo Jazz. Gostei da fidelidade com que interpretaram as músicas do disco e de como eles trocam de função e o som da banda continua com a mesma identidade. Também gostei de ter conhecido músicas pra mim inéditas como “Deusa do Amor” que, pelo que apurei, é do Bloco Afro Olodum, e já foi gravada em um dos discos anteriores do trio. Saí do Opinião mais do que satisfeito, a lamentar apenas o público pequeno, mas era meio de feriado e véspera de um dia normal de trabalho pra maioria dos que estavam em Porto Alegre.

Na saideira do show ainda encontramos o Ricardinho que nos disse que não está indo mais pra Recife em nome do amor.
– A patroa não quer ir pra longe dos pais, então decidi ficar até o final de 2008 e daí eles me transferem.
– Tá certo, então vamo ali no bigodes comer um xis, tomá mais uma ceva e enrolá o últmo...

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